OS CORONÉIS DO CACAU ERAM AMBIENTALISTAS?

OS CORONÉIS DO CACAU ERAM AMBIENTALISTAS?

Por: José Rezende Mendonça-TFFA Aposentado

Assisti uma palestra sobre o cacaueiro como conservador da Mata Atlântica e concordei com quase tudo. Agora é preciso desmistificar o que foi dito nessa palestra.

Um agricultor, herdeiro da época dos coronéis do cacau, que num tom muito firme e emocionado disse: “Os nossos avós que aqui chegaram nessa região           já tinham na sua grande sabedoria que conservando a Mata Atlântica, estariam eles pensando numa melhor condição de vida do homem e do planeta, por isso mesmo foram os primeiros ecologistas/ambientalistas na região do cacau”.

Foi aplaudido de pé e eu fiquei pensando se fora assim mesmo!…

Bom, hoje resolvi baseado pela experiência de mais de 30 anos pesquisando e trabalhando nesta região e voltando ao tempo, posso afirmar que a coisa não foi bem assim.

Na verdade os nossos primeiros desbravadores não derrubaram toda a Mata Atlântica, por acharem que o cacaueiro necessitava de sombreamento para que as plantas quando ainda novas não morressem pela exposição solar, senão fariam como fazem os sojeiros, pecuaristas e outros, derrubariam toda mata, pois estes não precisam de sombra para seus cultivos ou exploração da terra no plantio de gramíneas.

Para melhor desmistificar o que disse o agricultor de cacau, citaremos alguns trechos do romance, Terras do Sem-Fim de Jorge Amado. “A gente vive numas brenhas danadas, derrubando mata para plantar cacau… É trabalho dia e noite, derrubar mata e plantar roça… A cobiça e o desejo de enriquecimento levam os fazendeiros a se confrontar para quem às armas é a única lei”.

Nesta época, a Mata Atlântica nesta região, possuía uma densidade altíssima que chegava a 988 árvores/ha e 270 árvores com características adequadas para o sombreamento dos cacaueiros.

Com este desmatamento pelos desbravadores, nossa região passou de 270 árvores por hectares, para 76 árvores por hectares, o que representa um raleamento de 72% das árvores que formavam um manto contínuo da Mata Atlântica.

Mais adiante em 1968 a Ceplac, recomendou que se eliminassem mais árvores, pois nas pesquisas realizadas em campo, constatou-se que o cacaueiro em exposição direta a luz solar não era prejudicial ao cacaueiro, desde que fossem adotadas algumas práticas como: calagem, adubação, combate as pragas e um controle mais eficaz as doenças, e também que estes cacaueiros estivessem em solos profundos, para suportarem um período maior de estiagem. Com o preço do cacau em alta e financiamento barato os agricultores obedeceram a Ceplac e fizeram o “raleamento de sombra” e com isso eliminaram mais de 60% das árvores da Mata Atlântica que cobriam os cacaueiros. E ainda levados pela euforia a Ceplac passou a recomendar a IMPLANTAÇÃO DE NOVOS CACAUEIROS COM A DERRUBA TOTAL DA MATA.

Depois destas recomendações a região que já tinha em média 76 árvores por hectares, caíra para 38 árvores em média por hectare, ou seja, mais 50% da mata fora para o espaço.

Pelos dados que temos em nossas pesquisas podemos afirmar que nada menos de 89 milhões e 400mil árvores foram eliminadas nos 600 mil hectares da área de cacaueiros daquela época.

Por fim, queremos dizer que a dinâmica da ocupação da terra foi em função do momento em que os conhecimentos teóricos ou práticos eram disponíveis ou a serem desenvolvidos quando solicitados, em decorrência da demanda do produto agrícola (cacau). Em nome da melhor produção e produtividade esqueceu-se de pesquisar a prática ecologicamente mais correta.

Então na verdade, o que temos nesta região do cacau é um “esquelético verde” que representa apenas 17% do número de árvores da floresta original do século passado. Mesmo assim, vale salientar que este percentual de 17%, mesmo que baixo, deve-se ao cultivo do cacau, mas não pela suposta sabedoria dos agricultores em Meio Ambiente, e sim porque nossos cacauais (68.000 hectares) aproximadamente estão plantados em solos férteis.

Feito este relato queremos desmistificar que o “Coronel do Cacau”, não era por excelência um ambientalista, foi tudo conforme os interesses da época, que me perdoe o exaltado agricultor a quem me referi no começo deste artigo.

Agora vem o Porto Sul e já começam os ecochatos e pseudos ambientalistas com as mesmas ladainhas de 40 anos atrás. Será que teremos que cruzar os braços e parar no tempo, achando que o progresso virar da mesma maneira?…

JOSÉ REZENDE MENDONÇA

Técnico Agrícola – Aposentado (Ceplac). Especialista em Fotointerpretação e Cartografia. Fotografias aéreas, imagens de Satélite e Radar (Vegetação, Uso da Terra, Solos, Hidrografia, Relevo, etc.)